O Protocolo de Kyoto, de 1995, e o Acordo de Paris, de 2015, foram passos importantíssimos na luta contra o aumento de emissões de carbono e o aquecimento global. Este último, aceito pela União Europeia e mais 194 países – que juntos geram mais de 98% dos gases que causam o efeito estufa – trouxe novas regras e metas para os países lidarem com as mudanças climáticas.
Com essa nova pressão regulatória, empresas e grupos se veem compelidas a cortarem, ainda mais, suas pegadas de carbono. Atualmente, e, embora temporária, a opção mais comum para solucionar este problema envolve o uso de mercados de carbono, que operam transformando as emissões de dióxido de carbono em commodities.
Balança de Carbono
Suponha que todos os gases que causam o efeito estufa pudessem ser medidos em uma grande escala de uma balança. Quanto mais desequilibrada for essa escala, maior será a probabilidade de mudanças climáticas e seus efeitos negativos – como picos de temperatura e clima extremo. Os mercados de carbono atuam como contrapesos, que são capazes de equilibrar essa escala.
De um lado da balança, estão as empresas que emitem carbono, como as fábricas, usinas e transportadoras. Elas liberam CO2 no ambiente ao produzir produtos ou prestar serviços, pesando a balança. Do outro lado, temos iniciativas que ajudam a remover esse CO2 do ar, como florestas, projetos de energias renováveis e práticas agroecológicas.
Ou seja, se uma entidade não consegue reduzir suas emissões de gases do efeito estufa de forma direta, ela agora pode comprar créditos de carbono de quem está fazendo esse trabalho de captura. Isso cria um incentivo para quem investe em soluções que ajudam a manter o planeta equilibrado.
Funciona mais ou menos como um jogo: quem emite carbono precisa compensar esse impacto, e quem contribui para reduzir o CO2 no ambiente é recompensado. Assim, o mercado de carbono cria uma rede de trocas que ajuda a equilibrar a balança do nosso clima.
E quem define as regras desse jogo?
A maneira como os mercados de carbono operam é amplamente definida por acordos internacionais e pelas instituições que os coordenam. O Protocolo de Kyoto, efetivo em janeiro de 2005, foi o primeiro grande passo para criar um esforço internacional. Ele estabeleceu metas de redução para 37 países industrializados e economias em transição, totalizados pela União Europeia. Esses países poderiam usar o mercado de carbono para cumprir suas metas: se um país não pudesse reduzir suficientemente suas próprias emissões, ele poderia comprar créditos de carbono de outros países ou projetos que já tivessem "capturado" ou reduzido CO2.
No geral, essas metas somam uma redução média de emissões de 5% em comparação aos níveis de 1990, durante o período de cinco anos de 2008–2012, que ficou conhecido como o Primeiro Período de Compromisso.
Três anos depois, os países se reuniram na França e assinaram o Acordo de Paris, que definiu uma nova meta: manter o aumento da temperatura da superfície global bem abaixo de 2°C acima dos níveis pré-industriais. Sob o acordo, cada país deve determinar, planejar e regularmente relatar suas contribuições. Em contraste com o Protocolo de Kyoto, a distinção entre países desenvolvidos e em desenvolvimento é obscurecida, de modo que todos os países devem desenvolver planos para reduções de emissões.
Através do Artigo 6º do Acordo de Paris, estão previstos três mecanismos que fortalecerão mercados de carbono e a redução das emissões:
Transações internacionais. Países que excederem suas metas de redução de emissões podem vender o excesso para países que não atingiram seus objetivos;
Gestão centralizada. A COP29 definiu a criação de um mercado internacional de carbono, que será gerido pela Organização das Nações Unidas, permitindo o livre comércio entre qualquer parte do mundo, seja pelo setor público ou privado.
Mecanismo não-mercantil. Promoção da cooperação climática sem transações financeiras diretas. Ao invés da comercialização de créditos, busca-se compartilhar tecnologia e capacitação entre os países, de forma colaborativa.
Qual o valor de um crédito de carbono?
Primeiramente, precisamos entender que um crédito de carbono equivale a uma tonelada de CO2 capturado da atmosfera. O seu preço em moeda varia de onde ele está sendo negociado e da natureza do projeto associado a ele.
Por exemplo, em mercados regulados, como o Sistema de Comércio de Emissões da União Europeia (EU-ETS), o preço e a disponibilidade desses créditos são estabelecidos por políticas governamentais. Em 16 de dezembro de 2024, o valor de um crédito de carbono no mercado regulado europeu foi de 63,32 euros por tonelada de CO2, equivalente a R$ 404,00 na cotação do dia.
Já o mercado voluntário, onde entidades podem de maneira espontânea diminuir sua pegada de carbono, é mais flexível. Os preços são definidos principalmente pelo tipo de iniciativa (reflorestamento, tecnologia limpa, etc), certificações que o projeto possua e o impacto social e ambiental do projeto. Nesses mercados, os preços costumam variar entre U$5 a U$50.
E no Brasil?
A Lei 15.042, de 2024 que regulamenta o setor e cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) foi recentemente, 12 de dezembro de 2024, sancionada pelo atual Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
Será criada uma agência que se encarregará da elaboração de regulamentações e da aplicação de sanções às violações cometidas pelas organizações sujeitas a ela. Isso também será o caso de iniciativas próprias do governo ou de organizações que emitam mais de 10.000 toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e) por ano.
O CO2e é uma medida usada para comparar as emissões de diferentes gases de efeito estufa, levando em consideração o potencial de aquecimento global de cada substância e representa a quantidade total por quantidade de dióxido de carbono que teria o mesmo potencial.
Solução ecológica, econômica e social
Os mercados de carbono apresentam oportunidades em todas as frentes da sustentabilidade. Eles incentivam projetos e práticas de grande importância ecológica, como o reflorestamento, a proteção de ecossistemas naturais e o uso sustentável desses recursos. Criam também novas profissões e empregos, estimulando inovações tecnológicas e atraindo financiamentos internacionais para as economias locais.
Além disso, há um impacto social significativo. Muitos desses projetos de captura de carbono estão ligados a comunidades vulneráveis, promovendo inclusão social e criando fontes de renda sustentáveis. Iniciativas como reflorestamento, por exemplo, muitas vezes empregam trabalhadores locais, fortalecem práticas agrícolas regenerativas e melhoram a qualidade de vida dessas populações. Isto é, se essas iniciativas possuem governança transparente, rigor e credibilidade na implementação e medição dos impactos.
Ameaça aos créditos de carbono
Infelizmente, os mercados de carbono também não estão isentos de problemas, apesar de todas as suas inúmeras vantagens. Em 2023, cinco empresas brasileiras e três estrangeiras foram levadas à Justiça pela Defensoria Pública do Pará por irregularidades na venda de créditos de carbono (G1 Pará).
Este caso destaca toda uma gama de falhas na regulamentação e na transparência dos mercados de carbono. As empresas reivindicam direitos sobre áreas que eram, na verdade, terras públicas estaduais, enquanto a falta de monitoramento efetivo permitiu tais transações sem aprovação do governo ou consultas correspondentes com comunidades locais, violando assim as leis nacionais, bem como os tratados internacionais de proteção ambiental e social.
Também coloca em questão o papel de certificadoras como a Verra, responsável por certificar os projetos destacados na denúncia. Ao deixar de auditar as terras propostas pelos projetos, a Verra, portanto, não apenas coloca em questão sua própria credibilidade, mas também a confiança global nos mercados de carbono e os esforços internacionais de mitigação ambiental, pois créditos ilegítimos não geram nenhum benefício real para o meio ambiente.
Portanto, ressalta-se a necessidade de revisar os critérios e métodos de certificação, ter auditorias independentes, aumentar a rastreabilidade de dados e envolver aqueles diretamente afetados pelos projetos. Caso contrário, certificadores como a Verra e compradores de créditos de carbono podem, mesmo involuntariamente, se tornar cúmplices de práticas ilegais e sem princípios que só intensificam os danos ambientais e sociais.
Se você se preocupa com a sustentabilidade e deseja fazer parte de um movimento que vai além dos créditos de carbono, considere apoiar e se envolver com iniciativas que busquem soluções reais e locais.
O Laboratório de Botânica Aplicada à Agroecologia está na vanguarda da pesquisa e desenvolvimento de tecnologias limpas, e na aplicação de práticas agroecológicas que diminuem o impacto humano no meio ambiente. Junte-se a nós nessa jornada pela transformação ambiental, econômica e social! Entre em contato!